domingo, 29 de julho de 2012

EU NÃO SABIA QUE DOÍA TANTO – X - POR EDUARDO ANTONIO GOSSON.

EU NÃO SABIA QUE DOÍA TANTO – X
Por Eduardo Gosson (*)

“No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto(...)

EDUARDO ANTONIO GOSSON
(*) Poeta, presidente da União Brasileira de Escritores - UBE/RN.


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As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos”.
(Fernando Pessoa)

Estava neste Domingo frio de quase agosto a ler estes belos versos do poeta Fernando Pessoa, quando veio à mente lembranças dos meus familiares e a dura verdade: estavam todos mortos numa brevidade espantosa (em menos de um ano perdi os três tios que restavam e, recentemente, um filho: Fausto).
Tive o privilégio de ser educado por duas tias (Jamyle - mimosa e Hulimase - brilhante); sou o primeiro sobrinho, sou o primeiro neto de Antonio Moises Gosson, que migrou, com seus dois irmãos (Abdon e Moisés), para o Brasil, precisamente para a cidade de Maranguape (CE), no longíquo ano de 1925. Vinham em busca de novas oportunidades. Em mim equilibram-se o sonho e a realidade; a ternura e a firmeza; os dias e as noites.
Segundo minha tia Hulimase eu pareço com o meu avô Antonio ao ponto de, muitas vezes, ela se confundir e me chamar pelo seu nome. Os árabes que frequentavam a nossa casa sempre me chamavam de Antum (corruptela de Antonio) e vivi muitos anos no meio de plissados, saias, calcinhas, missangas, tecidos, no velho Armarinho São Francisco, colado às Casas Régio do senhor Reginaldo Teófilo, na Avenida Rio Branco, quando ainda se podia botar conversa fora sem medo dos tempos atuais. Em frente uma praça de taxi, onde se destacava a figura magra, alta e elegante (de terno e gravata) do motorista Manoel Henrique. Ainda faziam parte da paisagem: o fotógrafo Emílio Vale (e sua bela esposa que tinha a cintura e os quadris muito bem desenhados). Na sorveteria do senhor Aracati muitas vezes fui acalmar a alma. Do outro lado da rua, o consultório do doutor Wilson Ramalho, meu pediatra, que faleceu vítima de alcoolismo. Na esquina, a loja do meu amigo Fause, filho de outro árabe: Camilo. Juntos fazíamos carros com latas e madeiras e saíamos a brincar... sem pensar em que dia é hoje da semana. Como todo árabe pensa no lado prático da vida, Fause e seus dois irmãos (Semi e Faiçal) formaram-se em engenharia. Agora que quase todos eles se tornaram um quadro na parede, lembro-me do Mestre Cascudo: “- a morte existe, os mortos não!”.

Eu não sabia que doía tanto!

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